Introdução
A proteção ao consumidor no Brasil passou por uma notável evolução ao longo das últimas décadas, impulsionada pela necessidade de regular as relações de consumo em uma sociedade em crescente desenvolvimento econômico. Essa trajetória é marcada pela criação de um robusto arcabouço jurídico, que culminou na promulgação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) em 1990, uma das legislações mais avançadas do mundo no tema. Em 2021, com a promulgação da Lei nº 14.181, também conhecida como a Lei do Superendividamento, novas salvaguardas foram estabelecidas, reforçando ainda mais os direitos dos consumidores endividados. Esta lei tem o objetivo de evitar o colapso financeiro das famílias, promovendo uma renegociação justa de dívidas e a educação financeira.
Este artigo irá explorar a evolução histórica da proteção ao consumidor no Brasil, desde as primeiras iniciativas legislativas até a recente Lei do Superendividamento, que traz importantes inovações para o equilíbrio das relações de consumo.
O Início da Proteção ao Consumidor no Brasil
As primeiras iniciativas legislativas
O conceito de proteção ao consumidor no Brasil começou a ganhar forma nas décadas de 1960 e 1970, com a crescente urbanização e a expansão da oferta de bens e serviços. A rápida industrialização e a ampliação do mercado de consumo expuseram os cidadãos a práticas comerciais abusivas, incentivando a criação de mecanismos de regulação.
Uma das primeiras legislações voltadas para o consumidor foi a Lei Delegada nº 4 de 1962, que regulava a defesa contra o abuso do poder econômico. Embora voltada para o controle de monopólios e trustes, essa lei já sinalizava uma preocupação com o impacto dessas práticas sobre o consumidor final. No entanto, o cenário jurídico da época ainda era insuficiente para lidar com as novas demandas sociais trazidas pelo aumento do consumo.
O Código de Defesa do Consumidor e sua importância
A virada significativa ocorreu com a promulgação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) em 1990, um marco para a proteção dos direitos dos consumidores no Brasil. Esse código trouxe uma abordagem inovadora ao colocar o consumidor como parte vulnerável na relação de consumo, garantindo-lhe proteção especial contra práticas abusivas e contratos desvantajosos. O CDC incorporou princípios como a transparência, a boa-fé e a equidade nas relações de consumo, que se tornaram pilares do direito do consumidor no país.
O CDC também criou importantes mecanismos de fiscalização e punição, como os Procons, órgãos estaduais e municipais responsáveis pela mediação de conflitos entre consumidores e fornecedores. A criação de um sistema nacional de proteção ao consumidor foi fundamental para consolidar a defesa dos direitos, com o suporte de agências reguladoras, como a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica).
A Proteção ao Consumidor no Século XXI
Novas demandas e desafios econômicos
Com a virada do milênio, surgiram novos desafios para a proteção ao consumidor, especialmente com o crescimento das operações de crédito e o consequente aumento do endividamento das famílias brasileiras. As políticas de expansão do crédito, especialmente na primeira década dos anos 2000, foram fundamentais para a inclusão financeira de milhões de brasileiros. No entanto, o crédito fácil e a falta de educação financeira adequada também resultaram em um aumento expressivo do superendividamento, especialmente entre os consumidores mais vulneráveis.
O superendividamento se tornou um problema crônico, com inúmeras famílias incapazes de arcar com suas dívidas, colocando em risco sua subsistência e dignidade. Foi nesse contexto que se fez necessária uma nova legislação para lidar com os casos de endividamento excessivo, resultando na criação da Lei do Superendividamento.
A Lei do Superendividamento: Contexto e Inovações
O que é a Lei do Superendividamento?
A Lei nº 14.181/2021, também chamada de Lei do Superendividamento, veio complementar e atualizar o Código de Defesa do Consumidor, introduzindo importantes mudanças para evitar que o consumidor brasileiro se veja atolado em dívidas que não pode pagar. Essa legislação visa reequilibrar as relações de crédito no país, ao impor práticas mais responsáveis de concessão de crédito e facilitar a renegociação de dívidas de maneira justa.
Inovações trazidas pela Lei nº 14.181/2021
Uma das principais inovações da Lei do Superendividamento é o estímulo à negociação coletiva das dívidas, permitindo ao consumidor superendividado convocar todos os seus credores para uma audiência de renegociação. Isso permite que seja formulado um plano de pagamento que preserve o mínimo existencial do devedor, ou seja, o valor necessário para garantir a subsistência digna da pessoa e sua família.
Outro avanço significativo é a exigência de mais transparência nas ofertas de crédito. Agora, as instituições financeiras devem informar de maneira clara e objetiva os custos reais do empréstimo, incluindo todas as taxas e encargos envolvidos. Além disso, é proibido conceder crédito a quem já esteja em uma situação de endividamento que comprometa sua capacidade de pagamento, sem a devida avaliação.
A lei também criou mecanismos de educação financeira, visando orientar os consumidores sobre os riscos do endividamento e promover práticas financeiras mais responsáveis.