Introdução
As ações de busca e apreensão são reguladas pelo Decreto-Lei nº 911/1969, que estabelece as diretrizes para o procedimento. O objetivo do decreto é garantir que o processo seja transparente e que ambas as partes compreendam as “regras do jogo”. Contudo, nas lacunas deixadas pela norma específica, aplicam-se o Código Civil, o Código de Processo Civil e o Código de Defesa do Consumidor (CDC), uma vez que, de acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a relação entre bancos e clientes configura uma relação de consumo.
Apesar de o Decreto-Lei nº 911/1969 ser o principal normativo a reger as ações de busca e apreensão, ele apresenta diversas omissões em situações práticas que frequentemente ocorrem. Esse vácuo legislativo gera incertezas e divergências de entendimento entre os magistrados. Assim, cabe ao advogado, na defesa do consumidor, buscar as melhores soluções para o caso concreto, com base em precedentes e interpretações adotadas pelos tribunais.
Este artigo aborda exemplos de omissões do Decreto-Lei nº 911/1969 que não encontram respaldo unificado entre os tribunais, exigindo do advogado uma análise criteriosa das jurisprudências predominantes.
1. Segredo de Justiça
Um dos pontos controvertidos nas ações de busca e apreensão é a possibilidade de tramitação sob segredo de justiça. O Decreto-Lei nº 911/1969 é omisso sobre o tema, e não há consenso entre os tribunais acerca da admissibilidade dessa medida em tais ações.
Algumas instituições financeiras defendem o segredo de justiça, alegando a necessidade de proteger informações financeiras do devedor ou evitar que o monitoramento do processo por parte do consumidor, via advogado, possibilite a ocultação do bem a ser apreendido. Por outro lado, há magistrados que aceitam esses argumentos, permitindo a tramitação da ação de busca e apreensão em segredo de justiça.
No entanto, há juízes que entendem que o segredo de justiça só se aplica a hipóteses legais expressas, como proteção à privacidade ou segurança das partes, e que as ações de busca e apreensão não preenchem esses requisitos. Esses magistrados defendem a publicidade do processo, garantindo a transparência e o direito à ampla defesa.
2. Citação do Requerido
A legislação é clara ao estabelecer que o prazo para defesa do requerido começa a contar a partir da apreensão do veículo, com um prazo processual de 15 dias úteis. No entanto, a lei não prevê situações em que o bem é apreendido sem a presença do devedor.
Por exemplo, em casos onde o veículo é apreendido enquanto está sendo conduzido por um terceiro (amigo, vizinho ou parente do requerido), há questionamentos sobre a validade da citação. A formalidade do processo exige que o devedor seja devidamente notificado, e não há consenso entre os tribunais sobre se a apreensão do bem por si só constitui citação válida.
Alguns magistrados consideram que a apreensão do veículo gera o conhecimento necessário da ação de busca e apreensão por parte do devedor, permitindo que o prazo de defesa comece a correr, independentemente de sua presença. Outros juízes entendem que a citação formal do devedor é imprescindível e que a apreensão do bem sem sua presença não dá início ao prazo processual, cabendo à instituição financeira a localização do devedor para que seja devidamente citado.
3. Indicação da Localização do Bem
Outro ponto polêmico é a obrigação do devedor em indicar a localização do bem, quando solicitado pelo magistrado. Em alguns casos, o veículo objeto da ação não é facilmente localizado pela instituição financeira, e o juiz pode intimar o devedor a informar onde o bem se encontra.
Novamente, o Decreto-Lei nº 911/1969 é omisso em relação a essa possibilidade. Alguns magistrados defendem que o devedor deve cooperar com a localização do bem, com base nos princípios da boa-fé e cooperação processual. Para esses juízes, a não indicação do bem seria uma forma de obstrução à justiça.
Por outro lado, há uma corrente que entende que a obrigação de localizar o bem é do banco, e não do devedor. Nesse entendimento, a ação de busca e apreensão visa a recuperação do bem financiado, e, caso o banco não consiga localizá-lo, pode transformar a ação em execução para recuperar o valor do crédito concedido. Para esses magistrados, obrigar o devedor a indicar a localização do bem prejudicaria seu próprio direito de defesa.
Conclusão
O Decreto-Lei nº 911/1969, mesmo com as alterações legislativas, ainda carece de atualizações para lidar com as nuances das ações de busca e apreensão. As omissões presentes na legislação exigem do advogado uma análise cuidadosa das jurisprudências dos tribunais locais, uma vez que não há um entendimento consolidado sobre diversas questões processuais.
Diante das incertezas, é recomendável que o advogado busque fundamentar suas estratégias com base em súmulas e precedentes dos tribunais superiores, bem como nas disposições do Código de Processo Civil, Código Civil e Código de Defesa do Consumidor. Esses instrumentos complementares são fundamentais para orientar a condução das ações de busca e apreensão, garantindo a proteção dos direitos do consumidor e o equilíbrio nas relações contratuais bancárias.